A minha primeira viagem oficial como mala extra da minha irmã e do meu cunhado aconteceu pouco depois da entrada de 2017. Era dia cinco de janeiro quando eu, Jess e Kleiner arrumamos nossas coisas e seguimos a estrada até o litoral norte do estado de Alagoas, lugar abençoado com as praias mais lindas de todas, na minha não tão humilde e não tão imparcial opinião.
O destino exato foi São Miguel dos Milagres, a mais nova queridinha dos turistas quando o assunto é o estado onde nasci. Mesmo com sua popularidade aumentando bastante nos últimos anos – muito por causa do famoso réveillon -, a cidade não chega nem perto de receber um amontoado de turistas sedentos por sol e praia como ocorre naquelas que fazem parte do litoral sul.
Para nos acompanhar durante a viagem, nós três montamos juntos uma playlist com os mais variados estilos musicais. Algumas das músicas marcaram bastante e me remetem diretamente aos momentos que passei com eles na estrada, sempre que escuto novamente. Acho sinceramente que essas pequenas coisas muitas vezes tornam tudo mais especial.
Step outside, the summertime’s in bloom
Nossa primeira parada oficial foi a Praça da Fofoca. Sim, é isso mesmo – bem no meio da cidade de Milagres existe uma espécie de praça, com banquinhos de madeira, florzinhas e uma plaquinha que indica seu nome. Logo ao lado, há uma cadeira, também de madeira, com os dizeres “Sente-se e breve será corno” logo atrás. Pois é! Podemos dizer que presença de espírito é uma coisa que os milagrenses possuem de sobra.
Depois do reconhecimento inicial, que incluiu uma checada na rua onde iríamos ficar hospedados, seguimos para Porto da Rua, povoado localizado dentro de Milagres. É lá onde fica a Associação dos Jangadeiros, responsável pelo nosso passeio às piscinas naturais. Com nossas vagas já garantidas em uma das jangadas que partiria dali a algumas horas e levemente mais pobres – em plena alta temporada, ver peixinhos nos custou R$45 -, nos pusemos a admirar a paisagem logo em frente.
A praia de Porto da Rua não estava em seus melhores dias. Talvez houvesse chovido, talvez o maior fluxo de pessoas por ali prejudique a paisagem, os motivos podem ser muitos. Fato é que, mesmo sem ainda ter conhecido as demais praias da região, eu sabia, lá no fundo, que aquela não seria a melhor vista da viagem. Mesmo assim, o contraste que a combinação das várias jangadas coloridas com o céu azul brilhante forma é algo que merece nossa atenção.
Foi por esse motivo que passamos um tempo por lá, apenas olhando. Aproveitei a leve distração do casal para colocar em prática minhas inclinações fotográficas – foi a minha primeira viagem em companhia da câmera nova. Jess e Kleiner são sempre ótimos modelos, mas logo minha atenção foi desviada para um cachorrinho que se aproximou tranquilamente de onde estávamos e, sem titubear, seguiu direto para o mar para dar um mergulho matinal. Mais corajoso às 9h da manhã do que eu.
Tinha um tempo que eu não ia à praia
Decidimos ir em busca de outra praia onde pudéssemos passar a manhã e esperar o horário do passeio às piscinas naturais. Depois de rodar bastante – a sinalização para as praias é incrivelmente péssima e as placas, confusas – paramos em um lugar quase deserto que parecia fazer parte da Praia do Patacho. Quando eu falo quase deserto, quero dizer literalmente – não se via uma pessoa em um raio de muitos metros, fora a vibe paraíso abandonado que uma cabana e algumas pedras jogadas por ali passavam.
Não duramos muito tempo por lá – o receio falou mais alto. Ficamos apenas o suficiente para tirar algumas fotos e ver passar um casal de mochileiros que surgiram não sei de onde e foram para lugar nenhum: em um momento eles estavam ali apenas seguindo as ondas e no outro não estavam mais. A distração que ficar olhando para o mar provoca faz isso com a gente.
Desse pequeno paraíso perdido na Praia do Patacho, nós fomos direto para a Praia do Toque – ou Toque Beach, como ostentava orgulhosamente a plaquinha enfiada na areia bem na entrada da praia. Lá, sim, havia humanos: alguns guarda-sóis e pessoas passeando de bicicleta tornaram o local mais atrativo para nós ficarmos, especialmente porque não era nada exagerado.
Estava muito quente, e minha irmã e cunhado partiram logo para a água. Eu nunca fui fã de banho de mar – uma nordestina muito paia, sim senhores -, então resolvi ficar ali quietinha na sombra fotografando e filmando mais aquele pedacinho de paraíso. Pois é – quase todo lugar na rota ecológica dos Milagres parece um pedacinho de paraíso.
Não demorou muito tempo e, entre um clique e outro, logo deu a hora de voltarmos para Porto da Rua e subir na jangadinha rumo aos peixinhos.
Lança o barco contra o mar
Ainda conseguimos nos perder um pouco antes de finalmente reconhecer a discreta entrada para Porto da Rua, mas felizmente chegamos no tempo certinho. O responsável por nos levar até as piscinas seria o Cícero, jangadeiro que não demorou muito a nos contar orgulhoso que o programa Mais Você da Ana Maria Braga já havia gravado imagens por ali – e que ele apareceu nelas, claro! É muito bonito esse orgulho e prazer em mostrar a própria terra para o mundo. Algo que falta em muita gente – até mesmo em mim, algumas vezes. Mas vou aprender mais com você, Cícero. Pode deixar.
O caminho não foi longo, mas também não foi curtinho. Dividi o meu tempo entre admirar a paisagem de coqueiros e céu azul em volta, a água verdinha abaixo e o som do sotaque diferente dos nossos companheiros de jangada. Uma das coisas mais adoráveis quando se trata de visitar locais turísticos é poder encher os ouvidos com diferenças culturais – seja através de conversas ou de músicas. Sempre deixa a minha experiência mais completa.
Chegando lá, nossa jangada logo se juntou às outras que já aguardavam ancoradas por ali e nós nos juntamos aos turistas que já estavam interagindo com os peixinhos. De início, eu não fiz nenhuma questão de mergulhar e usar a máscara cedida por Cícero. Eu tinha ido ali ver peixinhos, eu sei, mas assim que entrei na água fiquei com muito medo de mergulhar e molhar a cabeça. Não, não é medo de mar e muito menos preocupação com o cabelo – estava mesmo era com medo de sentir frio e não aproveitar mais o passeio.
Anos antes, nas piscinas naturais de Maragogi, passei por essa situação e a lembrança é de extrema frustração. Era setembro, longe do auge do verão, e eu passei tanto frio que o moço que nos guiou precisou me acompanhar de volta para a lancha – eu observei o passeio de lá, agarrada nessa mesma canga da foto acima e tentando parar de bater os dentes.
Não queria repetir o episódio – mas eu resisti pouco tempo. Mergulhei de cabeça, vi peixinhos e fui feliz, mas não deu outra: frio. Tentei fazer o possível para me manter em movimento e focar no sol forte do meio dia, que era implacável na minha pele muito branca mas que mesmo assim não dava conta de me manter aquecida. No fim das contas, valeu a pena – o tempo passou, me entretive com a gopro (e com os peixinhos, claro) e logo era hora de retornar.
A volta sempre parece acontecer mais depressa que a ida, e então estávamos novamente na areia. E dessa vez com muita fome. O movimento naquele horário estava intenso, para todos os lados que olhávamos havia pessoas andando, tomando sol, conversando e aproveitando o dia. E para todos os restaurantes que olhávamos, não era muito diferente no quesito pessoas. Muitas delas. Todos estavam lotados. Fomos então andando tão depressa quanto a fome e o cansaço permitiam, em busca de algum lugar que estivesse tranquilo e não fosse levar embora todo o nosso dinheiro.
Encontramos o Luna Bar, que atendia perfeitamente o requisito da tranquilidade – mas não tanto o do dinheiro. Mesmo assim, foi lá onde ficamos. E preciso dizer que o ambiente com a vibe rústica, o melhor pirão que já comi na vida e o enorme pote de suco de maracujá que foi posto na minha frente me fizeram concluir que valeu muito a pena.
Estou falando sério a respeito do pote: pedi inocentemente um copo de suco de maracujá, como é de praxe sempre que vou em algum restaurante – mas o que definitivamente não é de praxe é receber não um copo, mas um pote. Veio até com a tampa! Por um momento, até pensei que fosse precisar pagar mais caro e corri para checar o cardápio. Mas era aquilo mesmo: só o conceito de copo deles que era bastante diferente do senso comum. E eu amei cada segundo dessa constatação. O suco ainda era feito da fruta, nada de polpa, então apenas imaginem uma criança feliz. Eu mesma naquele momento.
Com a questão da fome resolvida, era hora de finalmente irmos conhecer nossa pousada.
Um bom lugar pra ler um livro
Chegamos por volta das 16h nas Suítes Corais dos Milagres, nosso lugar escolhido para passar a noite. Fomos recepcionados pelos donos, um casal jovem e muito simpático que firmou residência em Milagres após terem se conhecido nordeste afora. Eles logo engataram um papo bem animado com meu cunhado e minha irmã e eu, meio distraída, fiquei observando o ambiente.
Apanhadores de sonhos, peixinhos decorando as paredes azul-claras e chaveiros de coração nas chaves dos quartos: parecia a definição de aconchego. E era mesmo: a pousada não dispõe de muito quartos, é tudo muito família – até o café da manhã aconteceu em apenas uma mesa. Na hora de irmos nos instalar no quarto, veio a surpresa: nós ficaríamos no único localizado no primeiro andar, com uma vista privilegiada para o mar. O arrependimento por ter reservado somente uma diária bateu bem forte.
Mas não lamentamos por muito tempo – deixamos nossas bolsas acomodadas e partimos de volta para a Praia do Toque, eleita a nossa favorita da região. Estava perto do pôr do sol. A iluminação dessa hora do dia é algo que eu nunca vou conseguir colocar em palavras – mas tento sempre colocar em imagens. Tudo fica mais bonito, mais suave, com um toque de fantasia que nos faz achar que aquilo não pode ser real. Não é por acaso que eu normalmente só fotografo nesse horário.
O clima na areia da praia estava ainda mais tranquilo do que horas antes. Apenas uma ou outra pessoa caminhando, passeando com o cachorro, um pai brincando com o filho. Sentei, peguei um livro e fiquei ali, observando meus segundos pais se divertirem um pouco. Foi assim que o meu dia virou noite.
Com a noite, veio também a missão de encontrar outro lugar para comer. Sem pensar muito, decidimos seguir a indicação da Lis e, já de banho tomado, fomos parar na E-có Restô & Pizza: eu, Jess, Kleiner e Barbie. Alguns dias antes, quando contei animada que iria passar um dia e meio em Milagres, Barbie respondeu mais animada ainda que estaria por lá na mesma época. Daquele tipo de coisa que, se combinada, não daria tão certo.
Ela já tinha jantado, então foi conosco apenas para acompanhar. E que companhia maravilhosa: a noite passou num piscar de olhos, em meio a conversas engraçadas, ambiente vintage aconchegante, pizzas finas e crocantes (até demais) e sucos de manga e maracujá com gosto de limão – os quais eu não consegui tomar. Felizmente, meu cunhado tomou a tarefa para si sem nenhuma hesitação.
O cansaço falou mais alto e não tivemos pique para muito mais. No dia seguinte, depois de um dos cafés da manhã mais amor que já tomei em pousadas por aí – e ainda dividindo a mesa com uma família italiana, o que fez meu coração ficar todo alegre por ter compreendido parte do que eles falavam – nós fizemos o nosso check-out e seguimos para a despedida do mar.
Na rua da pousada fica um dos trechos mais movimentos da praia de São Miguel. Por esse motivo, não nos demoramos por lá – tranquilidade era o lema. Seguimos então meio sem rumo e acabamos na Praia do Patacho novamente, em um local diferente do que fomos da primeira vez. Os acessos à praia são muito limitados e difíceis de encontrar intuitivamente por conta das pousadas beira-mar que praticamente privatizam tudo, mas ao menos dessa vez tivemos um pouco mais de sorte que antes.
And all I can hear is this sound
Uma pena que a sorte não alcançou o departamento do tempo – não demorou muito e começou a cair uma chuva fina, que não conseguiu se definir e ficou oscilando entre uma nuvem e outra. Apenas meu cunhado se aventurou na água, e eu e Jess ficamos ali quietinhas debaixo do guarda-sol vendo as horas passarem.
O som da chuva fraca e do vento nas folhas dos coqueiros embalou nossa manhã. Uma das coisas que mais me afasta da praia é o sol forte, que deixa vermelha minha pele não importa o fator do protetor solar que eu use e que faz doer os olhos e a cabeça – não nasci com a cor e o humor adequados para o litoral. Isso tudo faz com que eu aprecie os dias chuvosos na praia, ao contrário da maioria: aquela manhã foi maravilhosa para mim.
Na saída, enquanto recolhíamos nossos pertences rumo ao carro, Jess chamou minha atençao e apontou para o lado esquerdo de onde estávamos: lá estava a Barbie com a sua família, bem ali pertinho da gente, depois de um dia anterior de desencontros quando o assunto era praia. É como eu disse – se combinado, não daria tão certo. Dar um abraço na minha amiga fechou da melhor forma possível aquela viagem relâmpago que foi tão maravilhosa.
Ainda deu tempo de darmos uma passeada em Porto de Pedras, tirar umas fotos no letreiro enorme da cidade e admirar a sua paisagem, mas logo decidimos que era hora de voltar para casa. Era hora de voltar para Maceió.
O calendário marcava dia seis de janeiro, também conhecido como primeiro dia de trabalho voluntário da Lis, minha amiga linda, na fundação Casita de Nicolas, em Medellín. Eu estava em plena estrada, e, em meio às oscilações da internet, percebi que havia várias mensagens dela no meu celular. Abri, curiosa – eram áudios.
Apertei o play, torcendo para que a internet não me deixasse na mão, e o que ouvi foram empolgados “Hola, Jennifer!” vindos das criancinhas de lá. Foi assim que conheci o Rios (também conhecido como Juan Davi), a Alison e a Willy Wonka (também conhecida como Julie por mim, mas que só depois descobri se chamar Yuri – essa pronúncia do espanhol ainda vai me enlouquecer: anotem).
Ouvir aquelas vozinhas hablando español só deixou meu dia mais completo e meu coração todo bobo. Ainda conversamos novamente alguns dias depois, o Jennifer evoluiu para Jeninha e eu consegui sentir saudade de quem nem mesmo cheguei a conhecer.
- Os trechos de música ao longo do post fazem parte das músicas Don’t look back in anger (Oasis), A Praia (Cícero), O Velho e o Mar (Rubel), Nem um dia (Djavan) e Well I Say… (Trevor Hall), respectivamente.
- Fiz um vídeo sobre todos esses pequenos momentos que narrei – e vou deixar ele bem aqui: