Casa Rosada em Buenos Aires

A poesia segundo Buenos Aires

Casa Rosada, Buenos Aires

“Os loucos da região são como eu. Os mendigos perderam-se de amor e hoje vagam declamando poemas desconexos. Escrevem em pequenos pedaços de embrulho de pão e depois deixam suas obras-primas esquecidas pelas esquinas, bêbados de saudade de paixões reais ou imaginárias.”

Foi o que eu li logo nas primeiras páginas do livro de Fernando Scheller, O amor segundo Buenos Aires, enquanto esperava o sono vir sentada à mesa do 604, Recoleta, Buenos Aires. Todos já dormiam e eu estava ali, começando o livro que, supostamente, me faria entrar no clima da cidade. Sendo sincera? Agora, oito dias depois, eu sei que nós não precisamos de auxílio algum para que isso aconteça.

Visitar a capital da Argentina sempre foi uma lenda. Quando era menina nem mesmo pensava nisso, e vi surgir a curiosidade em 2013, aos 16 anos, quando meus pais decidiram comemorar os 25 anos de casados e acompanharam um casal de amigos que passaria uns dias por lá. Fiquei apaixonada por tudo que vi nas fotos e nas muitas pesquisas que vieram depois. Eu queria conhecer aquele lugar.

E assim meu pai prometeu que iria voltar, um dia, dessa vez comigo e com a Jess. Como viajar não é exatamente o hobby preferido dele, não levei muito a sério. Cinco anos se passaram e a promessa virou realidade quando as bodas de pérola finalmente chegaram: nós iríamos os quatro passar cinco dias em Buenos Aires.

Eu não tinha grandes expectativas e também não morri de amores logo ao desembarcar. Buenos Aires é uma cidade extremamente popular entre os brasileiros e isso acabava me passando uma sensação de que nada era inédito, que não teria como a cidade me surpreender além daquilo que eu via na internet. Esperava apenas ver e registrar tudo com os meus próprios olhos.

Só que não funciona assim. E eu deveria, bem lá no fundo, já saber disso. Nada é igual para duas pessoas diferentes e é impossível ter exatamente a mesma experiência que o outro. Aqueles de quem eu via as fotos não exploraram Buenos Aires com as mesmas companhias que eu. Não viraram as mesmas esquinas. Algumas, sim. Todas? Não. Elas não ouviram as mesmas músicas nem se depararam com as mesmas pessoas. Não viveram a mesma história. E é esse o conjunto de coisas que fazem uma viagem.

Recoleta, Buenos Aires

“Linda não é bem a palavra certa. Se Paris é uma mulher alta e magra, vestida nas melhores roupas, porém intragável e inatingível, Buenos Aires é uma italiana, já meio matrona e com alguns fios de cabelo grisalhos, um tanto parruda, maltratada pelo tempo e por amantes, porém ainda capaz de seduzir um rapazinho desavisado.”

A capital da Argentina é ritmada. Estamos sempre em busca do nosso próprio ritmo, mas a realidade aqui é outra: Buenos Aires é quem comanda. Pessoas apressadas tentando inutilmente aquecer um pouco mais do corpo ao enfiar as mãos em seus casacos. Lenços que cobrem os rostos desesperados de quem sente o vento gelado cortar a garganta e congelar as mandíbulas. O olhar casual de quem está ali somente a passeio – ou não, mas continua prestando atenção em mais do que a temperatura mesmo assim.

É importante, eu acho. Prestar atenção. Há uma linha tênue entre a severidade e aspereza de uma capital latinoamericana e a suavidade de uma cidade que tem muito a oferecer, basta que saibamos aceitá-la e interpretá-la da maneira certa.

Eu aceitei Buenos Aires. E espero que vocês também aceitem, através dos meus textos. ♡

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jennifer maccieira

escrito por

jennifer

Resposta de 0

  1. Jennifer, eu AMEI seu texto. Sério, sem querer desmerecer a qualidade de todos os outros, mas esse é o melhor de todos. Deve ser porque me tocou a alma. Continue escrevendo com o coraçao, e se algum dia você publicar um livro serei uma das suas primeiras leitoras, haha.
    A vida é corrida e as vezes passo muito tempo sem vir aqui, mas amo demais o blog de vocês e todos os posts.
    Um beijo!

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