carta aberta à minha irmã

Hoje faz trinta anos que o mundo te recebeu. E, sabe, eu acho que não posso falar pelo mundo, seria talvez um pouco presunçoso da minha parte.

Mas eu posso falar por mim. Um pouco ressentida, porque, veja bem, ele está com sete anos de vantagem com relação a mim — ou seis anos, quatro meses e dezenove dias. Afinal, eu sempre gostei de coisas exatas.

Mas ser sua irmã, nesses vinte e três anos, sete meses e doze dias, me ensinou a ver a beleza naquilo que a gente não pode controlar. E a gente não pode controlar o mundo, assim como eu não posso falar por ele, porque: que complicado. O mundo, quero dizer. Ser sua irmã não é nada complicado.

Eu diria que é a ação menos complicada da minha vida: ser sua irmã. É quase como cair no sono — suave, um deslizar da consciência, uma predisposição que já nasce com a gente. Porque eu não nasci sendo muita coisa — até hoje não tenho certeza se sou. Mas eu já nasci sendo a sua irmã.

E que coisa é essa que me deixa soar tão repetitiva? O que é que significa ser irmã? Com todo o vocabulário que adquiri em todos esses anos, de todas as palavras que já escrevi, nenhuma delas me vêm à mente no momento para poder explicar um sentimento tão poderoso que, veja bem, me deixa dando voltas e voltas tentando encontrar na lingua portuguesa algo que lhe faça justiça. Mas, veja só, eu acho que as encontrei. É tão óbvio. O que significa ser irmã?

Significa ser você.

Nem sempre o mundo é gentil, e nem sempre ele foi gentil comigo. Com a gente — porque eu sou você e você sou eu, diferentes nas nossas individualidades, mas iguais em todo o resto. Dividimos inúmeras coisas e somamos mais ainda. A vida é um ir e vir de sentimentos e partilhar eles com você muitas vezes é o que me mantém sã.

Hoje faz trintas anos que o mundo te recebeu, e veja bem, eu não posso falar pelo mundo. Mas eu posso falar por mim.

E eu tenho certeza que faz trinta anos que o meu mundo é um lugar melhor. Mas, você deve estar se perguntando, Jenn, você só tem vinte e três. Como que o seu mundo é um lugar melhor há trinta? Bom, eu só sei. Algumas coisas não precisam mesmo de explicação.

Juntas somos tanto. Uma vida inteira de amor e companheirismo — e o melhor de tudo é que está só no começo.

Só que o mundo — esse mundo complicado — não é sempre calmaria e coisas boas. Você consegue se lembrar por quantas tempestades já passamos? Elas também importam, e é por isso que eu faço questão de colocá-las aqui nesse texto. Você conhece as piores partes de mim e isso não muda nada, porque, veja só, eu continuo sendo a sua irmã caçula, pra quem você compra bolo de chocolate e entrega depois de chegar cansada do trabalho. Amor. É o que isso significa.

Das nossas tempestades, uma em especial toca em mim lá no fundo. Porque juntas nós já enfrentamos até mesmo uma delegacia cheia de outras mulheres que precisavam de ajuda assim como eu. Porque o mundo, você já sabe, é complicado. Eu lembro do dia anterior, quando eu estava na faculdade e te mandei uma mensagem falando que ele estava lá, me ameaçando, e como você chegou lá dentro de alguns minutos. Acho que não existe limites de velocidade quando estamos falando de amor.

Eu lembro de ver você chorando, deitada no seu quarto, e de ficar arrasada porque eu até poderia estar sofrendo, mas ver você sofrer era sofrer duas vezes. E porque eu sabia que, se pudesse trocar de lugar comigo, você trocaria.

Amor. É o que isso significa.

Mas felizmente isso passou, porque, veja só, tudo passa. E aqui estamos nós, aqui estou eu, escrevendo esse texto. Livre. Vendo você se maquiar — porque é na banalidade que a vida acontece. E eu amo ver você se arrumar — mas a essa altura eu tenho certeza que você já sabe disso.

Vamos às calmarias. Salvador. 2016. Você se lembra daquele dia em que estavámos lá na Avenida Amaralina dentro do quarto de hotel com as janelas coladas, pois é, coladas? Você começou a rir porque qualquer coisa de engraçada tinha acontecido, porque a vida também pode ser boa e com você o riso é certo. E no dia seguinte, quando o Adam Levine olhou pra gente lá do palco — porque ele olhou, olhou sim — e eu e você nos viramos uma pra outra na mesma hora porque vimos aquilo ao mesmo tempo, juntas. E você lembra como ficou tão acabada depois do show que sentou lá pela calçada e a mim coube ajudar nossa amiga a arrumar um táxi de volta ao hotel? E de como eu brinquei que naquele momento a irmã caçula era você.

Recife. 2014. Você se lembra daquele dia na Copa do Mundo em que a gente se sentou na arquibancada da Arena Pernambuco e minutos depois tivemos que mudar porque nós confundimos os lugares? É claro que confundimos. Isso é a nossa cara. E acabamos do lado do seu Enrique, aquele mexicano simpático que começou a puxar papo com a gente logo que chegamos. Tenho certeza que você se lembra. Foi um dia bom.

E você lembra daquela vez que perdemos um voo por causa de alguns minutos? Você é tão virginiana que até hoje não entendo bem como isso aconteceu. Sempre tão pontual, sempre a primeira a ficar pronta. Mas na vida acontece umas coisas misteriosas assim mesmo. E, sabe, eu tenho certeza que a culpa daquele voo perdido foi mais minha do que sua, no fim das contas. Culpada, admito. Porque, veja bem: eu não tenho nenhum planeta em virgem.

Conhecer mais do mundo sempre vai ser especial com você. Tão cheia de energia, inocência e brilho nos olhos. O mundo – esse mundo complicado – precisa de você e desse brilho. Juntas eu sei que a gente vai, aos poucos, espalhá-lo por aí.

Você é uma das melhores partes de mim, porque sou uma pessoa melhor a cada conversa nossa. É como disse a Rupi Kaur: a gente não precisa que nos ensinem a voar, mas é sempre bom ter quem nos lembre de que temos asas.

E, bem, você é o meu lembrete. Você sempre vai ser meu lembrete.

Porque eu não nasci tendo muita coisa. Mas eu já nasci tendo você como irmã, e o mundo pode até ser complicado, mas ele também é generoso.

Ele é tão, tão generoso.

Eu te amo, e amo todos os nossos momentos juntas — passados, presentes e futuros. Amo como aperta minha mão antes da decolagem porque sabe que eu tenho medo de altura. Amo como me faz rir mesmo em dias ruins. Amo como rouba as minhas roupas, mesmo achando que eu tenho um gosto-meio-que-duvidoso. Amo como me leva pra tomar sorvete sempre que a vida me dá algum dos seus baques.

Eu amo, amo e amo — amo porque sou, e não me resta nada além de amar. É isso o que você faz comigo.

E eu não posso falar pelo mundo, mas eu posso falar por mim.

Feliz aniversário. ♡

P.S. em algum momento esse post será atualizado com fotos. mas por enquanto você vai me perdoar, porque eu tô com preguiça, é meu ascendente em touro. sabe como é. 🙂

se você gostou, compartilhe!

jennifer maccieira

escrito por

jennifer

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

últimos posts

França

sentimentos parisienses

Já ouvi dizer que Paris é um sonho — eu digo que Paris é real. Não apenas porque estive lá; mas porque, assim como tudo

leia mais...

ruína y leveza

Em um dia desses, passeando pelo blog da Luísa, o Janelas Abertas, me deparei com um post listando alguns livros que falam sobre viagens. Logo

leia mais...
newsletter

além mar

escrita, literatura e viagens direto na sua caixa de entrada

© 2023 uma reescrita • amor e palavras | todos os direitos reservados

blog desenvolvido por afluir digital